Mirabolhação

Manuela estava ansiosa: rapidamente arrumava suas coisas tentando não esquecer de nada. Cobertor, blusa, meia, colchonete, cristais – conferiu tudo umas cinco vezes e foi se encontrar com Lorena e Flávia, suas amigas de infância. Juntas, conheceriam a Planta Professora, não sabiam nada sobre ela, mas estavam curiosas.

Depois de três horas de viagem, elas chegaram na chácara onde aconteceria a cerimônia. Uma grande fogueira estava posta no meio da clareira com vários bancos espalhados ao seu redor. Arrumaram seus lugares e se sentaram. Um senhor começou a chamá-las, uma a uma, e oferecia um cálice com a bebida da Planta. Logo que Manuela experimentou, sentiu o gosto amargo pela sua garganta e foi se sentar. Fechou os olhos e, em pouco tempo, sentiu seu corpo anestesiado e seus sentidos aflorados.

Ao abri-los, não viu suas amigas do seu lado. Nem a fogueira, nem a clareira e, sim, o local da sua infância – um grande parque, onde passava as tardes com suas avós. Tudo vívido, alegre e colorido. Manuela começou a andar pelo parque e avistou um grupo de senhoras. Aproximou-se e, para sua surpresa, viu suas avós. Nesse momento, sentiu seu coração acelerar, pois sabia que não era real, mas era tão reconfortante, que se questionou sobre o que era realidade, aquilo que via ou aquilo que sentia.

Suas avós sorriram quando ela se aproximou – era um grupo de senhoras negras e que aparentavam pertencer à diferentes épocas. Riam, dançavam, comemoravam e Manuela sorria de volta – felicidade compartilhada entre todas.

Ela se permitiu dançar, sempre sorrindo, e avistou crianças brincando em um lago. Ao chegar, viu seu reflexo, se enxergou criança novamente e mergulhou nessas lindas lembranças. O mergulho não foi na água e sim em uma bolha de sabão com cores vivas. Ela começou a gargalhar, e um fluxo de imagens perpassou dentro da bolha: brincadeiras com suas avós, sua mãe trabalhando, seu pai indo embora, suas amigas Flávia e Lorena junto dela na escola, seu primeiro beijo, seu primeiro luto – tudo era leve dentro da bolha de sabão.

De repente, tudo foi fluindo e desapareceu: uma despedida leve e plena. Manuela fechou os olhos sorrindo e, quando abriu novamente, viu a fogueira e suas amigas sentadas ao seu lado.

Aos poucos, ela foi voltando no tempo e no espaço e, com carinho, guardou em seu coração os ensinamentos da Planta Professora. Eles foram enviados através das mirações em uma bolha de sabão. Chamou, carinhosamente, de Mirabolhação.

gostou? comente!

Rolar para cima