Homem negro, roupas simples, foto antiga. Deve ter vivido no começo do século XX. Se assim foi, como foi sua vida? Foi neto de escravos? Trabalhava na roça ou na cidade? Sabia ler e escrever? Casou-se? Teve filhos? Morreu quando? De quê?
Tantas perguntas e nenhuma resposta. Mas ousarei traçar, dentro da minha perspectiva de vida, uma história para ele, no momento da foto.
Joaquim, 54 anos, trabalhador da roça, semianalfabeto – só sabia escrever seu nome, de sua esposa e de seus filhos. Casado (casara cedo, aos 19 anos), cinco filhos já criados.
Todos foram embora para a cidade grande em busca de novos horizontes – assim imaginavam -, ou de novas prisões. Mas isso já é a história dos filhos.
Ficara viúvo há alguns anos. Morava sozinho numa simples casinha de barro e tijolos. Tem um fogão a lenha onde cozinha seus alimentos.
Seus dias se repetiam sem novidades ou movimentos diferentes. A monotonia estacionou em sua vida, até porque nunca conheceu outra rotina. Não soube o que é estresse nem taquicardia. Não sei se a vida passou por ele ou ele, na sua inteligência, passou pela vida.
Pouquíssimas roupas. Não precisava de muitas, bastavam duas mudas. Enquanto uma era usada, a outra era lavada. Mas tinha uma roupa que guardava numa cadeira para datas especiais. Seu terno, sua gravata, sua camisa branca e seu sapato preto (dois números maiores que seus pés). Não possuía meias. Calçava-os diretamente nos pés.
Avisou seu vizinho que, quando morresse, queria ser enterrado com seu terno. Única roupa bonita. Seus filhos, se viessem ao seu enterro, não o veriam mal vestido.
Provavelmente já tenha morrido e tomara que tenha sido enterrado com terno e gravata e sapato no pé e que seus filhos tenham derramado lágrimas no seu enterro; e que tenha uma cruz em seu túmulo para saberem que ali está o homem daquela foto.