Sala de música

Poderia se chamar José, quem sabe não é assim que se chama? Poderia ser Madalena. Estes dias aprendi que pensar muito engessa, mas pensar pouco paralisa. Logo, pelo muito e pelo pouco, estes são José e Madalena. Ele era um artesão e seu instrumento de trabalho foi construído com seu esforço: um violino. Ela dançava ao som das cordas e cantava versos. Admiração, era o que sentiam.

No palco, os dois se entendiam pelo olhar. Uma intuição que nasceu no mesmo dia em que se conheceram. Madalena era de poucas palavras, utilizava a voz somente para o desempenho de seu ofício. José preferia o silêncio também. Sorriam um para o outro e pode ser que isso tenha sido o que de mais lindo eu assisti naquele palco.

Havia uma dificuldade especial na atenção ao espetáculo. Eram hipnotizantes em suas marcações. Quando se afastavam, um laço imaginário dava conta de que ali existia a mais sensível forma de sintonia. Que sorte a deles! Nas demais canções, a minha curiosidade ultrapassou a arte e me distraí na forma como se entreolhavam. Alguma coisa me convidou a pensar que se amaram, se amavam.

Na última música, dividiam um único microfone. José se abaixava um pouco, Madalena cantava na ponta dos pés e se equilibrava segurando nos braços do parceiro. Momento raro em que ele não tinha o violino entre seus ombros. Cantaram com a proximidade da boca, sentiam a respiração um do outro, o cheiro da pele, o hálito. Se compactaram em um único pedacinho do palco de um jeito que só se faz com muita intimidade.

Com os aplausos, um sorriso largo e um abraço carinhoso que fez meus olhos se movimentarem segurando algumas lágrimas. Madalena iria morar em outro lugar, se despedia de José naquele dia. Voltaria outras vezes, mas as distâncias amenizam intensidades. José dizia para ela voar solta. Ela não tinha outra opção.

Ele se despediu com um beijo de amigo. José saiu de cena. Madalena ainda mora em mim.

gostou? comente!

Rolar para cima