O leiteiro equilibrista

“Without our traditions, our lives would
be as shaky as – as a fiddler on the roof” – Tevye

Um Violinista no Telhado, filme de 1972, recebeu oito indicações ao Oscar naquele ano (concorria, por exemplo, com Operação França e Laranja Mecânica). Só ganhou em categorias técnicas, como fotografia e trilha sonora. Merecia mais.

Lírico e poético, a obra do canadense Norman Jewison se baseia no sucesso da Broadway de Joseph Stein (que também roteirizou o filme) que, por sua vez, é uma adaptação dos contos “Tevie the Milkman” criadas por Sholom Aleichem e Arnold Perl. A história se passa numa pequena aldeia russa no início do século XX, no período anterior à revolução. Judeus e cristãos vivem em paz, cada um em seu canto, sem se misturar. Tevye (Topol), um pobre leiteiro judeu, vive com sua família e decide casar suas filhas conforme a tradição judaica, ou seja, ele deverá “arranjar” o casório, situação que não agrada às filhas. Enquanto se desenrola a questão familiar do personagem do excelente Topol (morto em março de 2023, aos 87, de Alzheimer) Tevye e os judeus do país sofrem com a forte pressão do governo, além do antissemitismo. Uma narrativa que mistura alegria e tristeza, boa parte em forma de musical, inovando com a “quebra da quarta parede” pelo personagem principal, que conversa, por vezes, diretamente com o público – e com Deus. Numa das melhores cenas, Tevye olha para cima, reclamando: “Eu sei que somos o povo escolhido, mas de vez em quando você não poderia escolher algum outro?”. Senso de humor – agridoce, claro – apesar das incertezas.

A temática sempre provoca – um povo perseguido que luta para se manter íntegro e seguindo suas tradições. Conflitos até hoje não resolvidos que, infelizmente, se arrastam, com um capítulo terrível acontecendo neste exato momento. Mas a mensagem final é de amor e perseverança. O próprio título é uma metáfora: a imagem do violinista pairando no ar sobre os telhados dos casebres simboliza a sobrevivência apesar da dificuldade, num mundo em constante mudança. Somos todos violinistas se equilibrando, tentando tocar a vida, produzir arte, música, textos, relações. Sem cair do teto, sem quebrar a cara. E o pescoço.

 

Curiosidades que poucos sabem: o título do filme vem de uma obra do artista Marc Chagall chamada “The Dead Man”, que mostra uma cena de um funeral e um homem tocando violino no topo de um telhado. O diretor Norman Jewison entrou no projeto porque achavam que ele era judeu, devido ao nome. Não é, e revelou isso na reunião com os produtores, que o mantiveram. Para este filme ele queria um “tom terroso”, e informou isso ao diretor de fotografia Oswald Morris, famoso por usar cores pouco usuais nos seus trabalhos. Morris viu, na rua, uma mulher usando meia-calça marrom, gostou do tom e pediu a ela. Depois, gravou o filme todo com as meias por cima da câmera, e ganhou o Oscar.

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