Se é verdade que os bons hábitos vêm com exemplos, aprendi a gostar de ler com minha mãe. Tive a sorte de crescer numa casa onde livros estavam disponíveis por todos os lados. Eu sonhava em ler todos os livros que estavam na prateleira da sala de visitas – claro que deixaria de fora as velhas enciclopédias, para as quais eu não tinha paciência. Havia um espaço só meu, com os clássicos infantis, a coleção inteirinha de Monteiro Lobato e o minha obra preferida: Lili Inventa o Mundo.
Com a Lili, descobri a poesia. Quando a ganhei, no auge dos meus dez anos, não tinha ideia da grandeza do autor, mas me sentia extremamente confortável lendo seus versos leves. Sem complicações, com cabeça de menina, eu me divertia. Lili era praticamente minha melhor amiga. Lembro que não foi fácil entender porque a mãe é do tamanho do céu, apenas menor que Deus, mas a minha mãe explicou que era um trocadilho em função do número de letras das palavras céu-Deus. Hoje, tendo dois filhos, consigo sentir o que o poeta queria realmente dizer.
Pouco tempo depois, ganhei de Natal uma Agenda Poética do Mário Quintana, onde cada dia tinha um poeminha, de uma ou duas frases. Amei essa nova forma: como Quintana conseguia dizer tanto com tão poucas palavras? No ano seguinte, pedi ao Papai Noel o mesmo presente e me deliciei novamente com mais 365 observações precisas sobre a vida. Pena que sempre fui muito prática – virando a folhinha do calendário, jogo fora tudo o que diz respeito ao passado. Hoje sei que há coisas que nunca devem ser descartadas.
Domingo fui visitar minha mãe e me peguei passando os olhos, com carinho, pela minha mini biblioteca. Os dedos correram as lombadas como se dedilhassem um piano. Sem pressa fui lendo os títulos, recordando das histórias e percebendo como faz bem voltar no tempo. Minha amiga Lili estava lá a me esperar. Com sorriso largo, vi que era hora de apresenta-la para uma nova pessoa:
– Lulu, vem cá, tenho um livro para te dar!