Laça dor

Há uma estátua na entrada da cidade de Porto Alegre que dizem representar o gaúcho. Tenho dúvidas em relação a esta única ou maior representação, considerando que um povo pode ser forjado em muitas culturas e ser representado por diversos símbolos. A cultura riograndense apresenta cenários rurais nos quais a figura do homem campeiro, de bota, espora e laço na mão, encontra-se onipresente. Isto é fato. Mas teríamos outros símbolos que poderiam estar na porta da cidade a recepcionar seus visitantes. Afinal, a entrada é da cidade e não do Estado.

O homem da estátua veste uma saia, o chiripá, um pano enrolado como saia, até os joelhos, meio aberto na frente, franjado que tem origem indígena. À cabeça, usa uma fita que prende os cabelos, também de origem indígena. Um lenço atado no pescoço que originalmente era um pala de seda, trazido da cultura dos índios, embora, diga-se, que é um símbolo dos farroupilhas. O modelo das esporas tem em uma das origens o Chile. As botas de couro de potro ou de vaca, segundo um folclorista argentino, aparece em quase todos os povos primitivos da antiguidade. A guaiaca na cintura, larga, com bolsos para carregar moedas, é indumentária tanto de argentinos quanto de uruguaios. Veste uma camisa com mangas largas, aberta no peito, usada em muitos países europeus e das américas.

Penso que a estátua em questão é bastante plural culturalmente em suas vestes, podendo representar a miscigenação de índios e europeus que constituíram, ao longo do tempo, o cidadão rio-grandense. Sua postura, de braços e pernas abertas, ereto e, de certa forma, com um olhar de desafio e jogado ao horizonte, remete à pose de herói. Relatos confirmam que a busca do artista que o esculpiu era essa mesma.

A afirmação dessa obra em bronze como símbolo da cidade, expressa pelo porto-alegrense em votação pública no ano de 1992, leva a acreditar na força que o homem do campo tem no imaginário dos cidadãos da capital. Na força das histórias contadas de geração em geração.

Eu, mesmo acreditando em outros símbolos para minha cidade, aprecio a figura do Laçador. E gosto de contar às pessoas que, ao chegar em Porto Alegre e vislumbrar a imagem, penso:

“Esse é o cara que laça dor daqueles que por aqui passam. Nessa cidade as pessoas podem até se aproximarem sentindo alguma dor, mas, ao cruzarem com ele, a dor não entra na cidade. Ele é o guardião da nossa alegria.”

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