Tom Saldanha em foto de Gabriel Munhoz

Imensidão

Tom Saldanha

Ah, imensidão! Quanta água já inundou tuas areias; quanto sol te secou para arrancar de ti o sal? Quantas pegadas foram destruídas para manter-te virgem?

Estradas esconderam-se nas tuas marés para evitar que te molestassem. Esforço vão.

Bem-vindo quem tira o sustento das tuas entranhas; seus pés marmorizados não te agridem, pois são leves como as asas das gaivotas que decoram os teus céus.

Suas mãos arenosas te acariciam e te protegem porque sabem que só com brandura e afeição tirarão de ti a vida que lhes faz falta.

Ah, imensidão! De quantas retas é feito o teu horizonte que se curva para todos os lados e, sem percebermos, se transforma na esfera definitiva que engole incrédulos?

Onde os azuis se encontram e tudo se embaralha, ali pousam os olhares de quem viaja aventuras milenares, cujos destinos estão sempre muito além.

A linha trêmula que separa céu e água esconde novas Ítacas, tão próximas quanto distantes, inspirando buscas sem fim. A viagem nos modifica: ao final, não seremos mais os mesmos.

Versões modernas do barco de Teseu, mudamos tanto que Plutarco inventaria em nós um novo paradoxo.

Ah, imensidão! Quanto vento impeliu jangadas e quanto remo empurrou canoas por teus líquidos caminhos?

Sem deixar pegadas ou rastros, sem desenhar estradas, quantos te atravessaram guiados pelas estrelas e iluminados pela presença solitária da lua?

Quantos queimaram ao sol antes de encontrar uma sombra neste imenso deserto liquefeito?

Oh, imensidade de imensidões, que pareces não ter princípio ou fim; que inacabas porque não começas; segue no teu ininterrupto vai e vem.

Leva contigo o que sobra em mim; e traz em troca o que nem suponho me faltar.

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