Identidade e alteridade

Tudo o que forma um corpo e adquire singularidade se transforma numa unidade idêntica a si mesmo. A este fenômeno chamamos identidade. Mas, paradoxalmente, a consciência da própria identidade se constrói na relação com o outro. A existência do si, como ser singular, se faz na relação com a alteridade.

Um aspecto importante da identidade é a autodefesa. É a capacidade de reconhecer o que sou e quem é o “outro” que pode ser ameaçador. Nosso sistema imunológico funciona desta forma. Identifica o não eu e o elimina.

Segundo o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, para reagir ao invasor o sistema imunológico deve reconhecer a ameaça e combatê-la. O outro, nesta relação imunitária, teria um caráter negativo.

Da mesma forma, segundo Han, o reconhecimento de si, a percepção dos próprios talentos e daquilo que podemos criar e oferecer ao mundo, teria um caráter positivo.

O filósofo analisa a sociedade sobre estes dois aspectos: positividade e negatividade.

Segundo ele, o século XX se caracterizou por um excesso de negatividade. Ou seja, as relações se pautaram sobre a desconfiança ao que é estranho ao si mesmo. Tudo o que não sou eu é ameaçador. Interessante notar que cada pessoa tem a própria identidade, mas também faz parte de outras identidades que podem ser grupos, associações, times, nações etc.

No excesso de negatividade existe uma crescente tendência ao conflito e à competição na relação com a alteridade. No mesmo excesso persiste a ideia da existência de um outro, mesmo sendo ameaçador.

Para Han, a partir da entrada no século XXI começamos a migrar da negatividade para a positividade. A má notícia é que o funcionamento positivo também pode ser excessivo. Desta forma, no extrapolar da positividade, cada indivíduo se volta somente para a própria performance. Passa a buscar rendimento máximo vinte quatro horas por dia. A única forma de se sentir vivo é ser produtivo e, por isso, produz o tempo todo. Todas as atividades, inclusive as de laser, devem ser produtivas.

Enquanto no excesso de negatividade a pessoa se esforça para dar o máximo e superar ou eliminar o outro, no excesso de positividade o outro é cancelado, deixa de existir. A pessoa passa a competir consigo mesma. O lema é a superar os próprios limites.

Quando não existe a alteridade, o si mesmo colapsa e a única forma de sentir-se vivo é produzir. O burnout , a depressão, a hiperatividade são os principais sintomas do nosso tempo. Frutos de uma escravidão auto imposta.

A solução proposta por Byung-Chul Han é sábia e simples. Reconhecer a si depende de encontrar o outro. O encontro sem objetivo produtivo, pelo prazer de estarem juntos. Ou seja, brincar, dançar, namorar…viver.

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