Existem duas obras que situam as cidades entre desenvolvidas ou subdesenvolvidas. Uma, tão invisível quanto necessária. Outra, tão necessária quanto visível. O modo como os gestores públicos contemplam as verbas retiradas da população, através dos impostos, denuncia o ímpeto ou a renúncia em colocar seu município lá ou cá. Cá ou lá. Basta uma chuva para constatarmos a diferença.
A primeira obra é de infraestrutura. Nada deveria ser mais prioritário do que oferecer aos moradores de um lugar uma rede decente de água, esgoto e drenagem pluvial. Somam-se vias organizadas e limpas, energia elétrica e iluminação pública, saúde, segurança e educação. Em poucas palavras, tudo o que faz a distância entre o conforto e a precariedade. Cuidassem apenas destas obras, com competência, maravilha: todo o desembolso compulsório estaria justificado.
A segunda obra é a de arte. Desde a arquitetura até a música, da dança até a dramaturgia, da culinária às artes plásticas, do circo à literatura – e nas centenas de subdivisões de cada uma das manifestações humanas daí derivadas –, tudo o que é criado pelo homem para encantar merece incentivo e preservação. Uma cidade que valoriza a arte é um lugar que atrai os olhos do mundo, e pessoas com instrução e sensibilidade precisam compreender isso, quando no comando.
Dias de chuva têm o condão de fazer emergir tais aspectos. Primeiro, escancaram as mazelas de uma infraestrutura precária, condenando os habitantes ao caos. Depois, afundam no tédio e na desesperança um homem que se vê incapaz de imaginar ou transcender. No momento em que vejo as poças d’água transformarem a imagem refletida das paredes da Casa de Cultura Mário Quintana numa obra de Gaudí, lembro do que senti quando em Barcelona: Porto Alegre poderia ser assim. Obstrui as bocas de lobo a diferença que nos condena ao não ser.