Dirigindo à noite, a chuva desanda e a visibilidade é quase zero. Ele teima em seguir viagem, guiando-se pelos “olhos de gato” que demarcam a faixa de rodagem. A escuridão e a velocidade lhe atordoam, fazendo com que a sinalização balance à sua frente, ao ponto das linhas paralelas se encontrarem.
Desde há muito tempo, ouvira falar das torrentes e ocorrências estranhas daquela estrada que leva ao morro dos macacos. O responsável pela locadora, quando soube do seu destino exigiu uma apólice de seguro total e geral para entregar-lhe o veículo.
Empolgado em conhecer a aurora mais brilhante da terra, não se preocupou com as advertências recebidas. Quer chegar logo para admirar as luzes da cidade e depois embriagar-se na fantasia do alvorecer. Sabe de todas as lendas daquele percurso. Que se trata de uma provação do tipo “jornada do herói”, e que poucas pessoas conseguiram alcançar, incólumes, o mirante ao final da estrada.
A investigação que fizera ao planejar a viagem lhe deu uma certeza. Todas as tragédias têm uma explicação lógica e ocorreram face a imprudência ou ignorância dos desastrados. Alguns, por inábeis, caíram ao dirigirem pela estrada sinuosa que circunda o precipício. Os que voltaram cegos, surdos, ou mudos, foi por não se prepararem para enfrentar a exuberância da luminosidade, e sucumbiram aos apelos sórdidos daquele local inebriante.
Ao perceber pelo para-brisa uma imagem semelhante à torre Eiffel, agrava-se a sua confusão. Tenta se convencer que o fenômeno decorre do reflexo dos “olhos de gato”, que se diluem ante os pingos da chuva e da sinuosidade da estrada. O sonho de conhecer Paris está presente, mas sabe que antes precisa passar pela provação do morro dos macacos. Chega ao final da rodovia com o carro descontrolado, quebra o parapeito do mirante e desaba morro abaixo.
Ao localizarem o corpo e o veículo destroçados, o policial retira um pequeno objeto e comenta que encontrou intacto um suvenir, a miniatura da torre Eiffel, pendurada no suporte do espelho retrovisor interno.