Meu pai uma vez fez fotos para documentos com um lambe-lambe na Praça XV. Foi no final dos anos 1970. Naquela época havia um grupo de fotógrafos que prestavam seus serviços por ali, na altura da esquina da Marechal Floriano com a Otávio Rocha. Tiravam a foto, revelavam e entregavam para o cliente na hora, isto é, em poucos minutos. Não sei que fim levou essa foto, mas lembro que na época achei de muito baixa qualidade. Hoje entendo que era o possível naquelas circunstâncias. Acho que o velho fez as fotos lá porque foi o preço mais baixo que achou.
Sim, houve um tempo, e nem faz tanto tempo assim, em que ia-se a um estúdio especializado para tirar fotos para documentos.
A primeira que tiraram de mim foi em preto e branco. Eu devia ter seis ou sete anos de idade. Deve ter sido para minha carteira de INPS, provavelmente meu primeiro documento com foto.
Depois das em preto e branco, as fotos coloridas. E agora as fotos digitais. Não há mais estúdios especializados em fotos para documentos, embora ainda haja estúdios para fotos. A tecnologia se transforma.
Acho que foi em uma mesa de bar que alguém comentou comigo que os ingleses foram pioneiros na tarefa de criar documentos para as pessoas com o registro de impressões digitais. Depois esses documentos receberam o acréscimo das fotografias. Meios para controlar as populações do Império Britânico. Acredite o leitor ou não. Eu acreditei.
Não sei quando isso começou no Brasil.
Meu avô, nascido no final do século XIX, e falecido em 1978 ou 79 foi retratado assim. Podia ser meu avô no retrato que vejo para fazer esta crônica. Um homem negro com trajes do início do século XX (ou, talvez, do final do XIX). Uma foto em preto e branco. Ou em sépia.
Em 2006 posei para o fotógrafo Varceli Freitas, durante a Feira do Livro. Ele se apresentava como o úlitmo lambe-lambe de Porto Alegre. Devia ser mesmo. Naquela época Mário Quintana e Carlos Drummond de Andrade ainda estavam voltados para o General Osório, e posei entre eles. Eu estava em busca da fotografia artesanal. Contra a fotografia digital. As imagens digitais já tomavam conta na época e eu as achava homogeneizadas e pasteurizadas (ainda acho, mas é praticamente impossível lutar contra a obsolescência do uso da película nesses arrabaldes onde vivo). Lembro que gostei da rusticidade do resultado. Lembro também que achei a diversão cara na época.