Os Jorges
Dora Almeida
Em Paris, talvez eles fossem chamados bo bos, diminutivo de bourgeois bohème, em português, burguês boêmio. Termo usado lá com uma certa ironia, quando se fala de pessoas nas quais o discurso não condiz com o estilo de vida. Vivem economicamente à direita e votam à esquerda, uma espécie de esquerda caviar no Brasil. Pois aqui em Porto Alegre, me falaram outro dia que temos os Jorges. Não me perguntem o porquê da denominação, pois não consegui descobrir ainda. Diferentes dos bo bos , não tem ideologia política. No entanto, como eles, são homens bem-nascidos, elegantes, usam roupas caras, vivem trocando de carro, sempre pelo último lançamento. Moram em bairros nobres da cidade, mas gostam de ir à lugares mais descolados, mais divertidos, e frequentados por pessoas de todos os tipos, como a Cidade Baixa ou o Centro. Agem com ar de superioridade, muitas vezes com atitudes machistas e preconceituosas, depois voltam para seu bairro chique e sua vida sem preocupações.
Um desses Jorges é Átila. Bonito como ele só, tal qual um modelo de capa de revista. Vive na casa dos pais. Corre no Parcão todas as manhãs. Passa grande parte do tempo na academia, malhando seu belo corpo de músculos muito bem definidos. Noite dessas, noite de Grenal, a pedida era assistir ao jogo em um bar ao ar livre na Cidade Baixa. A cada gol do seu time os Jorges gritavam, pagando bebidas para as meninas e, um pouco por isso também, delas julgando-se donos.
Final de partida, Átila pega uma das garotas, arrasta consigo e a leva para um motel. Mostra-lhe um par de algemas. Ela se sobressalta, mas consegue virar o jogo. Aproveitando-se de ele estar muito bêbado, convence-o a se deixar algemar primeiro. Ele sorri e aceita: Depois é tua vez!
Ela chega mais perto, algema-o na cama, acaricia seu corpo nu e amarra sua boca com a fronha do travesseiro. Ele se debate, mas ela acena sacudindo as chaves e vai embora, não sem antes carregar com toda sua roupa.
Na manhã seguinte, o telefone toca no elegante apartamento do Moinhos de Vento. A governanta atende e chama Dona Licinha:
– É o Átila. Pede que a senhora vá pegá-lo neste endereço. E leve uma muda de roupa.