Aparentemente as palavras ingenuidade e inocência tratam exatamente do mesmo fenômeno. Creio que isto acontece porque encontramos estas duas características em crianças pequenas. Na pureza dos infantes quando ainda confiam na vida e nas pessoas. Aquele encantamento e riso fácil provocados por um abraço, uma historinha ou canção de ninar.
Quando convivemos com bebês que estão dando seus primeiros passos, podemos nos maravilhar com a beleza do ser humano: tão simples e inteligente, com tanta necessidade de ser acolhido e amado. O quanto aquela pequena criatura é capaz de estrear a existência se entregando ao amor em total confiança, sem dúvidas de abandonos.
A inocência é um estado de fé na vida, impulsionado pelo desejo de conhecer, de interagir e desfrutar através de todos os sentidos. Uma predisposição à alegria do viver.
Nessas tenras meninices as desconfianças ainda não cresceram, são brotinhos que vêm da intuição, que servem à autopreservação.
A criança ouve histórias que, para elas, são todas verdades. Esperam por papai Noel, seguem pegadas de talco atrás do coelho da Páscoa. São ingênuas.
Com o crescer do corpo, crescem também as conexões entre os fatos, surge o óbvio, a verdade. Descobrem que velho de barba branca no shopping é apenas um senhor tentando sobreviver num subemprego temporário. É só o início de uma série de revelações. De certa forma, são saboreadas pela criança que se percebe cada vez mais autônoma e esperta.
Mas não são todas as descobertas que têm gosto de conquista. Chega o tempo das decepções. A constatação das contradições do mundo adulto, aquelas pequenas mentiras do cotidiano que disfarçam autoritarismos, manipulações e jogos de poder. As traições, os abusos. Algo que era preferível não ver, não saber, mas que vai se impondo, com gosto amargo e cheiro de tristeza.
A ingenuidade vai se tornando como um jogo de balões a gás que nos tira da realidade, nos eleva à outras explicações que contrariam a obviedade. Então chega o tempo em que os balões estouram, um a um. Temos que largá-lo pois a terra nos chama com sua crua concretude. Caímos.
O estatelar-se no chão estoura nossa alma que olha lá em cima e ainda vê a ingenuidade se afastar no último balão que ruma na direção de um arco-íris, buscando um pote de ouro, em um país de ilusões.
Vem a tristeza que, em sua finitude, é infinita para quem a vive. Uma nevoa cobre a inocência, que também parece perdida para sempre. O corpo, antes doce e macio, vai se tornando rígido por tensões e couraças. Sentir passa a ser sinônimo de sofrer.
Amadurecer parece um deserto ou uma prisão. Mas, em algum momento aquela criança diz: – Oi! Estou aqui!
Lá no centro labiríntico de nosso coração ouvimos a voz doce de nossa inocência, como um bálsamo ela nos cura, nos permite novamente ver as cores brilhantes da vida. É quando nos damos conta de que, agora adultos, somos os pais da divina criança que vive dentro de nós.
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