Cynthia Torp por Soraia Schmidt

Retalhos

Soraia Schmidt

Reflexos, luz e sombra. De cada um e de todos. Se sobrepõem. Uns dentro dos outros. Como se não fossem sólidos, mas etéreos. Fantasmas. Pode-se ver através dos corpos, ultrapassá-los. Ver a fusão das partes no todo, na paisagem lúgubre do anoitecer urbano. Cada um com sua inscrição no mundo. Pessoas e coisas, desenhos e marcas, concretos e abstratos. As janelas, os bancos, o jornal, as vidraças, as luzes, os sapatos, o arlequim, a senhora, os gorros, a bolsa, o coque do cabelo, os olhares, as pernas, as posturas, o cansaço, o fim do dia, a noite que caiu, o vagão, o trem. A rua, as luzes, a cidade. Parados e em movimento, juntos e separados: coisas, pessoas, histórias. O tempo, a vida.

Todos se misturam e se distinguem. Individual e coletivo, comum e diferente, plural e singular. Operários, trabalhadores, senhoras, senhores, leitores, pichadores e o aviso colado na parede. O trem e a noite os conduzem. O cotidiano e o tempo.

Luzes foscas, pessoas ofuscadas. Mesclam-se. O trem segue.

O distinto casal, a postos para descer, em seus capotes de chuva. As pernas cruzadas em elegância revelam uma distinção. Contrastam com o jeito simples e informal de um arlequim. Recostado no banco, num entre relaxar e descansar, com semblante sério, em assombro, revoa pensamentos e parece perguntar. Nesta hora, quem sabe, ele é outro.

 

Vida comum. O complexo e simples, juntos.

Vida parada e indo no trem que segue.

Espelho, reflexo, retalhos.

É denso, pleno, repleto.

É quando tudo se congela em um momento.

É quando se pode parar em um instante e descer.

Teremos vivido.


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