Ela nunca teve interesse por exposições de arte. Em suas viagens pelo mundo, visitou inúmeros museus e galerias não por interesse próprio, mas acompanhando seu marido que era alucinado por qualquer tipo de exposição. Particularmente, as de arte moderna. Aqueles ferros retorcidos que para ela eram sucata que poderiam ter ido pro lixo, para ele eram um deleite. Rabiscos numa tela branca quase o faziam chorar. E ela naquele tédio. Mas como na vida a dois eram parceiros, tinham outras afinidades, ela pensava: ok, mais um museu, vamos lá!
Então, quando ele a convidou para a exposição de uma amiga em comum nem procurou saber que tipo de arte ela produzia. Mas nada a tinha preparado para aquilo.
Num lindo e restaurado casarão, encontraram em cada cômodo, uma composiçao: uma bicicleta enferrujada e uma porta de um carro antigo.
– É de um opala anos 1970 – ele disse, fascinado.
Noutro cômodo um relógio cuco enorme e uma cadeira de balanço quebrada; em outro, máquinas de escrever e telefones de diversas marcas e cores e, no último cômodo, uma catraca solitária (de ônibus? de algum estádio de futebol?). Não importa, aquela catraca foi um gatilho para levar seu pensamento longe.
Ela trabalhava numa agência bancária bem perto de sua casa e podia ir a pé para o trabalho. Uma colega era sua vizinha e, muitas vezes, voltavam juntas.
Num certo dia, tiveram uma reunião após o expediente e já passava das oito da noite, quando finalmente puderam ir para casa. Como era inverno, decidiram pegar um ônibus que passava bem em frente à agência. Seriam apenas quatro quadras, mas ficaram com medo de voltar a pé, pois, já estava bem escuro.
Como fazia muito frio, a colega estava usando um casaco de peles. Era mais comum do que nos dias de hoje o uso deste tipo de agasalho.
Pegaram o ônibus. Quando foram passar pela catraca, a amiga deu-se conta que esquecera a carteira no trabalho e falou ao cobrador:
– Você não vai acreditar, mas estou sem dinheiro para pagar a passagem.
Ele, obviamente, não acreditou. Parecia impossível que ela vestida daquela forma, não tivesse um único tostão para pagar a passagem.
– Tua amiga não pode pagar?
– Só tenho para a minha passagem, a outra disse.
Ele, debochado, gritou para o motorista:
– Abre atrás que a madame vai descer!
E naquele lugar silencioso de pura contemplação, ela começou a rir. Seu marido não entendeu o motivo do riso. Ela constrangida, não conseguia esquecer a cena. E ria cada vez mais.