A menina testa a força das mãos sobre a pele esticada do tambor. Protegida pelo muro, ela não enxerga as mulheres que cantam, apenas escuta a pujança daquela toada, uma harmonia de sopranos, mezzo sopranos e talvez alguma contralto. A melodia entra pelos seus ouvidos e ela não consegue deter a cadência do corpo, embalado pela união de primeiras e segundas vozes.
A menina testa o ritmo das mãos sobre a pele esticada do tambor. Tenta acompanhar o compasso da cantoria. Ainda não sabe da força das mulheres que agora cantam e de todas as que vieram antes delas. Mulheres caçadas no campo, jogadas nas fogueiras, amordaçadas dentro de casa, humilhadas, violentadas. Mulheres que resistiram aos maus tratos, que não calaram sua sabedoria, que não aceitaram sufocar o corpo e a alma.
A menina testa a força e o ritmo das mãos sobre a pele esticada do tambor e tenta acompanhar o compasso da cantoria. As vozes das mulheres, harmonizando os diferentes timbres, lhe causam um arrepio, embora ainda não compreenda que não sossegarão até que os direitos humanos deixem de distinguir os gêneros.
A menina tem a força de todas as mulheres, herança que se consolida com o uso e rejuvenesce com o tempo, e todas as mulheres têm o ritmo da menina. Como tambores, ecoam na eternidade.