Depois de se aposentar, ele resolveu se entregar a todas as coisas que não tinha experimentado: aulas de canto, curso de trabalhos em vidro, oficina de violão. O que viesse, traçava. Claro, dentro de certos limites: professores com bom currículo, turma selecionada, nada dessas aulas com bolsas para carentes. Depois de uma vida dedicada aos valores da boa moral, não via motivo para se misturar com gente sem qualificação. E, a cada novo início, tinha a certeza de ter encontrado um norte a ser seguido.
Foi morar em frente à Redenção; agora as caminhadas diárias e a proximidade benfazeja da natureza lhe trariam renovação, inspiração e outros desejados ãos. A caminhada diária logo se transformou em semanal, depois quinzenal, mensal… até que o aconchego da poltrona de casa o chamou para um período – necessário, afirmava convicto – de introspecção.
Período também interrompido quando, ao passar pelos clubes náuticos da zona sul da cidade, foi fisgado pela ideia de virar velejador. Verdade que não tinha veleiro, mas isso era banalidade a ser resolvida no futuro. Animadíssimo, matriculou-se no curso de vela. As aulas teóricas lhe trouxeram grande prazer, quanta coisa nova para assimilar! E que colegas classudos, só homens de bem.
À tardinha, esperava ansioso a chegada da esposa, para compartilhar os conteúdos tão atraentes. Não entendia por que a mulher, voltando do trabalho cansativo e pensando em relaxar na banheira, não demonstrava o interesse que ele esperava. Vai entender as mulheres! – pensava intimamente, sem se deixar abater pelo detalhe.
Findas as aulas teóricas, iniciaram-se as práticas. Agora, sim, seria o ápice da aventura, o macho alfa renovado! O entusiasmo infantil o fazia esquecer que, descuidado da atividade física, joelhos e ciático estavam dando sinais de alerta. O que era uma dorzinha para quem tinha um novo futuro à frente?
Primeira e segunda aula, sem descer do barco, tudo bem, manteve o ânimo. Na terceira aula, era preciso forçar o barco a virar e fazer com que retornasse à posição original. Engoliu água poluída, teve que ser puxado para dentro do barco, porque os músculos não acompanhavam a intenção, era a imagem da frustração. Voltando ao píer, recusou-se a aceitar ajuda para descer. No salto para a terra ali tão próxima, os olhos registraram por um instante interminável a surpresa: os joelhos, recusando-se a colaborar, o fizeram cair estatelado no chão. Fiasco total.
Nos dias de hoje, ao passar próximo ao clube, lança um olhar enviesado para o farol azul e branco e não se furta a comentar que aquele professor não tinha condições de ensinar, era um incompetente.