“Não vemos as coisas como são. Vemos as coisas como somos” ( Anaïs Nin).
Dia desses, assim do nada, apareceu no meu olho esquerdo uma minúscula sombra, que dançava ( e ainda dança), conforme meu olhar mudava de foco. Apavorada, corri para o Oftalmologista. Depois de diversos exames, o diagnóstico: apenas uma mosca volante, provinda da miopia e das aprontações do Tempo. Mosca volante de estimação!
Então, hoje quero falar sobre os olhos e suas conexões. Ver é um dos sentidos mais relevantes e fantásticos do corpo humano. Tão necessário, que a pessoa acometida pela cegueira consegue ver com as mãos e com o coração. O olho humano, de acordo com a Biologia, é capaz de distinguir até 10 mil cores. É mais perfeito do que as câmeras fotográficas modernas na captação de imagens. Mas, tem lá seus defeitos: quando invisibiliza a pessoa negra, pobre e diferente. Quando a cor negra é considerada imperfeição.
De acordo com o professor Adam Andersan, da Universidade Cornell de Nova Iorque, “Os olhos evoluíram há mais de 500 milhões de anos para os propósitos da visão, mas agora são essenciais para a percepção interpessoal”. Assim, os olhos influenciam nossas memórias, deixam entrever as dúvidas na hora de decidir. Através do olhar, são externados diversos comportamentos: discriminante, triste, surpreso, amendrontado, intolerante, raivoso, feliz, amoroso… Literalmente, os olhos revelam emoções e preconceitos.
Os olhos humanos, além de moscas volantes, podem apresentar patologias físicas e sociais. Astigmatismo e miopia são comuns e podem ser corrigidas com óculos, lentes ou cirurgia. O grande problema é não querer ver. Desfocar a visão das coisas, situações e pessoas, que deveriam ser vistas, notadas; comandar o cérebro para mudanças e tomada de atitudes.
Não querer ver as tragédias ambientais tão denunciadas pelos Cientistas e não perceber os seus reflexos e sinais. A humanidade faz vista grossa para a conexão entre os desastres naturais, o racismo, a diversidade e a pobreza. Não divisar que o racismo ambiental afeta comunidades vulneráveis em todo mundo.
Não querer enxergar a mensagem subentendida depois das eleições e o que nos revela sobre o futuro dos direitos humanos. Vitória do conservadorismo é síndrome da miopia e, da cidadania, a abstenção.
Não querer refletir sobre a permanente sub-representação das mulheres na tomada de decisões, vítimas da discriminação e da violência.
Fazer de conta que não percebe que a paz e a segurança global estão em rísco; que há ameaça de armas nucleares e outras armas de destruição em massa; que há aumento do comércio ilícito e das diversas formas de tráfico.
O grande problema é não querer ver. Não tem água no copo, nem comida no prato de milhões e milhões de pessoas. A letalidade policial atinge mais jovens afrodescentes que vivem na pobreza: há um racismo sistêmico no Brasil. Em 2023, 82,7% dos assassinatos cometidos pela polícia foram de jovens negros.
Há dificuldade de descortinar o trabalho análogo à escravo, que ocorre nos quatro pontos cardeais do país. Para se ter uma ideia, em 2023, o Ministério do Trabalho e Emprego identificou 3.151 de pessoas submetidas à escravidão. E os números, poderiam ser maiores se não houvesse déficit de pessoal na pasta, especialmente auditores fiscais.
Para as patologias sociais da visão não há cirurgia, lente ou óculos. Há sim urgência de mobilização coletiva-cidadã e investimentos em educação popular para os direitos humanos. É preciso abrir os olhos!
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