Sou de Sant’Ana do Livramento, morava na frente da Praça General Flores da Cunha, mais conhecida como Praça dos Cachorros porque ali existem dois galgos de granito, e estudava na esquina de casa, no Colégio Estadual Professor Chaves.
Jamais esquecerei minha querida professora do primeiro ano, Dona Teresinha Martins. Imagino que, à época, tivesse menos de 30 anos, uma bela mulher, altiva, doce, as pernas sólidas, morena. Ao terminar a aula, eu a acompanhava nas suas compras em Rivera. E ela seguia dando-me aulas, pois pedia que eu lesse os nomes das lojas e dos cartazes de propaganda ao longo da Calle Sarandi. Eram passeios memoráveis, eu toda feliz, de braços dados com minha professora.
Também fui muitas vezes, com minha mãe, visitar suas tias e tios, atravessando a cidade vizinha. Nessas ocasiões, passava por um jardim de infância e ficava encantada, olhando pela janela, vendo aqueles pequeninos, uniformizados, de avental branco e azul, com gravata de fita, desenhando, pintando, brincando, e mais de uma vez os vi examinando o que hoje percebo ser uma tela de algum pintor da Banda Oriental.
Anos depois fui à Espanha e vi, pela primeira vez, um museu sendo visitado por crianças, acompanhadas de sua professora. Deveriam ter seus sete, oito anos, todas sentados no chão, de olhos arregalados, vendo Velásquez, e tendo uma aula sobre a arte pictórica, sobre a época em que o pintor viveu etc.
Lembrei imediatamente da minha professora Teresinha, e pensei como teria sido bacana ter sido sua aluna numa cidade com um museu como o Prado.
Passados outros tantos anos, fui com Vitória, minha filha de três anos, para Barcelona, e a levei para conhecer os museus do Picasso e do Miró. Lembro bem da pequerrucha olhando as telas com figuras aparentemente bizarras do primeiro, e infantis do segundo,
sem estranhamento, encantada.
Inesquecível também a visita que fizemos ao Aquarium de Barcelona. Lembro dos olhos arregalados dela, vendo peixes de todos os tipos, cores e tamanhos, indo de um lado para o outro, sem se baterem, e ela perguntando Como é o nome desse azul?, E daquele vermelho?, E os tubarões, podem quebrar o vidro?, E se isso acontecer, o que acontece? – Mãe, que lindas as estrelas do mar, e os cavalos marinhos, e as plantas marinhas.
É mágico assistir o olhar deslumbrado das crianças descobrindo o mundo.
Considero mágico também ter o privilégio de envelhecer e, de forma entusiasmada, continuar buscando salvação por meio da arte – só ela e os afetos salvam, digo sempre, criando memórias que irão abastecer minha alma quando já não for possível trotamundear.