2 Phil Devries

Intervalo

Teresa tem dois filhos, Theo e Pedro. Contou-me essa história enquanto estavámos no intervalo de Norma e bebericávamos uma flute de champanhe. Theo mora com Thaís no Recife e Pedro com o marido, Paulo, em Milão. Teresa está separada, trabalha, e tem uma vida confortável.

Disse-me que se organizou para vir a Montevidéu, nesta época, pois ama o bel canto. E como é eclética, também queria ir na Funfun e dar uma olhada nas livrarias da Ciudad Vieja, pois ama ler em castelhano. Também quer aproveitar a culinária uruguaia e comer asado de tira e morcilha – adora a salgada e detesta a doce, disse-me, acrescentando que não come essa iguaria em Porto Alegre porque é feita de forma muito diferente.

Contou-me que, hoje pela manhã, saindo do seu hotel em Pocitos para el desayuno en alguna cafeteria cercana, frisou no seu castelhano cantado, tocou o seu celular. Ela prefere cada dia tomar o café da manhã em um lugar diferente e, quando estava decidindo aonde iria, atendeu o telefone. Estranhou o telefonema de Pedro naquele horário, ainda mais pelo fato de que, atualmente, todos enviam uma mensagem no WhatsApp antes de telefonar. Ouviu a voz do caçula entre aborrecida e apreensiva.

– Mãe. Abre a porta! Estás dormindo? Estou tocando a campainha e não atendes!

– Como assim, tocando a campainha?

– Mãe, estou com o Paulo na porta do teu edifício. Não é possível!

– Como assim, tocando a campainha? Enquanto faz essa pergunta, me diz que não entendeu nada, que estava a caminho do café da manhã e que imaginara que os filhos lhe telefonariam mais tarde.

Disse-me que, do outro lado da linha, o filho afirmara:

– Uma festa surpresa pelos teus 60 anos, mãe! Tudo organizado por nós, Theo e Thaís. Onde estás? Volta que daqui a pouco chegam as encomendas dos quitutes e também as bebidas que precisamos gelar porque, como sempre dizes, bebida quente não dá!

Teresa toma outro gole do seu champanhe e repete para mim o que disse ao filho: Vocês deveriam saber que detesto surpresas. Ainda mais festa surpresa, não me faltaria mais nada.  Da próxima vez, peçam para alguém me assoprar a surprise – e gargalhou.

Contou que finalizara a conversa dizendo que Pedro telefonasse para Noemi, que tinha a chave da casa; que desejava que os filhos e amigos se divertissem e lhe mandassem uma foto pelas onze da noite, pois tinha ingresso para assistir Norma no Teatro Solis e depois jantaria no Las Perdices.

Teresa, então, sorri para mim, não só com os lábios, também com os olhos, como quando estamos verdadeiramente felizes, e diz que está muy contenta. Toca o sinal para retornarmos aos nossos lugares e, no caminho, medito sobre a independência e autonomia de minha amiga Teresa.


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