Não foi por acaso que o gato sorrateiro saltou para o telhado. Correu atrás do achado que, leve, cortava o ar em movimentos rápidos. Um beija-flor, distraído entre flores e brisas, não percebeu a aproximação traiçoeira. O salto foi preciso, mas o desencontro inevitável. O susto ficou no ar, suspenso entre o pulo do gato e o voo fugaz do pequeno pássaro.
Sorte ou superstição?
Na sacada da frente, uma abóbora com a expressão vazia de um Halloween esquecido. Talvez fosse um presságio, um lembrete de que há forças que se movem além do nosso controle. O susto foi real, mas efêmero, como a sombra que passa ao final da tarde. Eu, já menos aflita, atrevi-me a buscar um gole d’água. A água pura, cristalina e suave, misturada ao sabor doce do orvalho que descia livre ao pé das flores. Talvez o mesmo doce que o beija-flor buscava, voando cada vez mais alto, fugindo da ameaça felina.
O gato, no entanto, não desistia. Com os olhos estreitos, cravados no ar, ele seguia o voo do beija-flor. A paciência era sua aliada. Os movimentos calculados. O galho balançava levemente com o vento, e lá, no fim daquela dança silenciosa, a flor aguardava, serena, como se soubesse que seu destino dependia de um pássaro que brincava com a gravidade.
Voa, meu beija-flor. Voa para longe das garras do destino. O céu é teu refúgio, e o vento, teu guia.