Infelizes consequências da Grande Enchente de 2024 são sentidas o tempo inteiro, e isso parece não ter data próxima para se encerrar. Não importa o quanto alguém possa pensar que restou ileso: ninguém escapou, escapa ou escapará desta teia de relações. Caminhando no Centro Histórico, há mais do que marcas da água na parede: há um sentimento de incredulidade.
Neste final de semana, por exemplo, pude constatar o fato de ainda estarmos imersos em dificuldades ao comparar a sessão de autógrafos da Santa Sede de 2023 e 2024. Primeiro, é preciso dizer que foi linda, perfeita, plural, animada, emocionante como costumam ser nossas datas maiores. Receber os leitores na 70ª Feira do Livro de Porto Alegre foi um privilégio. A diferença esteve por conta dos preços das passagens aéreas.
Dois de nossos livros abrigam autores distantes: Recife, Belo Horizonte, Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, Araraquara, Campinas e Curitiba. Cedo reservei a data, pois com antecedência é possível conseguir passagens em conta. Porém, com o aeroporto Salgado Filho fechado, vir a Porto Alegre ficou difícil. Pouco adiantou já estar operando durante o período da Feira – perderam-se as chances de baixo custo. Não culpo quem não veio, culpo o destino.
Perder a chance de abraçar amigos é sempre um prejuízo incalculável. Encontros pessoais não têm preço. Desde o “você parecia mais alto” que experimentei com o Rodrigo, até o “nunca imaginei encontrar uma mulher de um metro e oitenta” diante da Miriane, a festa do encontro frente a frente oferece sabores variados, com predomínio da doçura. É lindo entregar os livros pessoalmente, nas mãos dos autores, e ver em seus olhos o prazer da conclusão da jornada. Atenua em muito a frieza das telas.
Queria ter, pela primeira vez, olhado nos olhos da Aurea, do Luiz Augusto, das duas Denises e do Kener – ah, como teria sido bom. Também rever os amados Antônio, Iris, Claudinha e Marina, parceiros de um encontro afetuoso ao extremo no ano passado. O abraço na Michele, na Patrícia, Nelson, Felipe, Amélia e Ângela, cada um impedido de estar conosco por motivos variados (numa paleta de ótimos a péssimos) está apenas adiado – são todos daqui, não dependemos do aeroporto. Fizeram muita falta, viu?
Quanto a você, meu leitor, por valores nada salgados é possível encontrar a fina flor da crônica brasileira nos livros do ano da Santa Sede. Nossos “Bilhetes de viagem” em homenagem a Cecília Meireles, além de “Outra vez, jamais” e “Apesar de nós” – os dois volumes das safras presencial e virtual. Recomendo com muita intensidade: a tragédia climática nos abateu, mas não nocauteou. Fica a gratidão a todos os escritores que mantiveram o nível nas alturas.