5 Iara Tonidandel

Dona Yara

Dona Yara era uma vizinha simpática. Sempre prestativa. Quando íamos viajar, alimentava nossos gatos e limpava as caixas de areia. Às vezes, quando não estávamos em casa, e algum pacote chegava, ela sempre recebia e nos entregava depois. Quando podíamos, retribuíamos, o que era quase nunca, pois ela quase nunca abandonava a própria casa. 

Uma senhora que desde que nos mudamos para aquela vizinhança estava ali. Ela era prestativa mas não nos visitávamos. Pela idade, devia ser aposentada. Acho que uma vez outra vizinha disse indiscretamente que Dona Yara era aposentada do serviço público. Acho que sempre foi solteira. Quando ela tinha visitas, e percebíamos, e ela via a curiosidade em nossas expressões, comentava que eram uma sobrinha, com seus filhos, sobrinhos-netos. 

A casa dela era pequena e bem cuidada. Tinha um pátio em frente, onde ela cultivava um jardim. Também tinha dois gatos. Na janela da frente da casa, ela pendurava bebedouros para os passarinhos. Naqueles pequenos receptáculos de plástico colocava água com açúcar. 

Os bichos aproveitavam. Era comum que pardais e andorinhas fossem beber ali. Entre os pássaros, os mais graciosos eram os beija-flores. Os pequenos helicópteros capazes de pararem no ar, com asas tão pequenas e de tão tremenda intensidade. Se os pardais e as andorinhas precisavam pousar para beber esse néctar, os beija-flores produziam um bailado no ar, com suas asas e suas cores brilhantes ao sol. Alguns com predomínio de tons vermelhos, outros azuis. E só pela variação de cores de eu saberia que eram mais de um, porque, em geral, cada beija-flor aparecia sozinho. 

Contudo essa atividade generosa com os passarinhos tinha um contraponto algo sinistro. Os potinhos de água com açúcar também atraíam abelhas. E para espantar as abelhas Dona Yara borrifava nelas inseticida. As abelhas, claro, morriam às dezenas. Considerava isso uma situação ruim, mas nunca me achei no direito de reclamar. 

Em um feriado prolongado, viajamos e Dona Yara, como de costume, se dispôs a cuidar de nossos bichanos. Foram bons dias no litoral.

Quando voltamos encontramos nossos gatos com os potes de ração quase vazios, as caixas de areia cheias, e fezes fora das caixas. 

Saímos à rua para falar com Dona Yara, mas a casa estava fechada. 

Fomos conversar com a vizinha da casa do outro lado. 

– Vocês não souberam?

– Não. Estávamos na praia.

– Uma pessoa passou pela frente da casa, e viu ela deitada. Nos chamou, eu e outros vizinhos. Nós chamamos o socorro médico. Quando chegaram, viram que ela tinha morrido.

– É. Ok. –  Eu fiquei chocado. – Ela já tinha uma certa idade. O socorrista disse alguma coisa sobre causa da morte?

– Não. Mas comentou que parecia que ela tinha um monte de picada de abelha.


gostou? comente!

Rolar para cima