As férias escolares na Vila dos Bancários, zona sul de Porto Alegre, eram maravilhosas e cheias de aventuras.
Incontáveis as opções. Quer nos dias ensolarados, nublados e até mesmo, nos chuvosos. Raramente agendadas, as atividades sempre fluíam facilmente com a patota da vizinhança.
Jogar bola nos campinhos improvisados ou no asfalto mesmo. Às vezes, inclusive no grande campo de areão no curral da Cavalhada. Quase certo que alguém lascava um dedo do pé.
Bicicleta, pião, pandorga, bolinha de gude, pequenos pneus de bicicleta com um aro de arame, bafo com figurinhas de álbum, lombas com os carrinhos de rolimã, botão de mesa e por aí vai.
Sem dúvida – a peripécia mais legal – era subir o Morro do Osso.
Este passeio demandava certas combinações prévias. Quer para juntar as coisas necessárias, quer para tentar adivinhar a previsão do tempo.
Sal, fósforos, cantil, boné, guides, joelheiras, canivete e o principal armamento da época : a funda.
Sorte nossa que, nos arredores, sempre encontrávamos goiabeiras – nada melhor para encontrar uma boa forquilha. Já a borracha e o courinho, careciam de uma caminhada um pouco maior, até a borracharia do Seu Adão. Ele sempre dava um jeito de conseguir retalhos, de preferência de borrachas não “cansadas”, ou seja, com boa elasticidade.
Chegada a ocasião, subíamos o monte em busca de descobertas surpreendentes, juntando nossas munições – pequenas pedrinhas, de preferência arredondadas.
Adentrados na mata fechada, enchíamos os cantis e nos refrescávamos com os pés dentro do pequeno córrego, com aquela água cristalina. Enquanto isso, nossos olhos aguçados já exploravam os galhos das frondosas árvores, tentando identificar nossos tira-gostos.
Sem necessidade de aviso, o primeiro em condição de disparo, poderia dar início à caçada, respeitando o pacto assentido por todos : Bem-te-vi, João-de-barro e Beija-flor, nunca!
Fuçávamos os sabiás e as pombas do mato. Os mais rechonchudos.
Os menos hábeis normalmente ficavam para trás, junto ao riachinho, recolhendo gravetos para formar o braseiro.
Outra convenção nossa era : caçou, limpou, comeu. Em média, todos pegavam entre dois e três alados.
Nem sempre conseguíamos encontrar suprimento. Parecia que alguém tinha avisado todos os passarinhos do morro que estaríamos por ali.
Numa ocasião destas, me embretei num pequeno capão, cheio de macegas espinhentas, atrás de um bater de asas diferente. Após a sofrida e lanhada busca, avistei o lindo e serelepe colibri. Sentei, arranhado e frustrado, admirando aquele pássaro diminuto, exibir sua elegante agilidade.
De mãos vazias, retornei ao grupo que já estava assando suas proezas.
Não cacei, não limpei e não comi. Afinal, a regra é clara.