11 Carla Penz

Generosidade, uma dádiva

Caminhando vagarosamente entre os leitos, Alice dirige-se até o pátio para desfrutar seu intervalo, tendo na mão uma caneca cheia de café quentinho, que recém fora passado.

Nestes breves descansos, era inevitável deixar de pensar na sua trajetória até os bancos externos das barracas brancas com aquelas cruzes vermelhas.

Os flashbacks recorrentes a transportavam para sua tenra idade, onde vivenciara emoções profundas, que determinaram seu percurso pessoal e profissional.

Mesmo com todas as dificuldades para discernir o que realmente acontecia em seu redor, no colo daquele tio com roupas e chapéu engraçados. Para complicar ainda mais, ele usava uma máscara desengonçada, assim como tantas outras pessoas que corriam de um lado para outro em sua volta, por entre fumaças e bombas.

No início, os barulhos das explosões pareciam antecipar a comemoração do seu sexto aniversário, que se avizinhava. Fruto das desculpas que seu bondoso pai lhe dedicava na tentativa de confortá-la naquele incompreensível cenário.

O tempo passou lenta e duramente, desde a certeza de que seus pais tinham virado estrelinhas no céu até ser acolhida generosamente por uma família correta e amorosa.

Sua determinação em ajudar os outros foi aflorada muito cedo e, com isso, antes ainda da sua adolescência, decidiu que seria médica e assim ajudaria pessoas.

Perspicaz, aproveitava seus momentos de folga na faculdade de medicina, para devorar livros, manuais e quaisquer notícias a respeito de movimentos caridosos ao redor do mundo.

Não foi difícil optar pela Cruz Vermelha Internacional, onde imaginava poder ajudar o maior número de pessoas possível.

Alice só não prosperou nos relacionamentos amorosos – afinal, nunca foi sua prioridade. Tinha certeza de que não desejaria para nenhum dos seus, vivenciarem o mesmo que ela. Portanto, era ela por ela. E assim construiu sua estável carreira dentro dos alojamentos de containers, barracas e, por vezes, em hospitais ao redor do mundo.

Muito além de devaneios, as pausas oportunizavam uma espécie de retroalimentação, que lhe asseguravam manter seu destino com segurança e foco.

Resguardo que não sentiu nos braços daquele esquisito mascarado quando pequena.

Embriagada pelas memórias, volta à realidade quando chamada por colegas :

Alice ! Alice ! Estão chegando mais três caminhões com pessoas !

E assim, segue sua vida em paz, gratidão e felicidade, sendo sua força motora, a extraordinária generosidade.


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