Silêncios
Altino Mayrink
A mudança de estação está no ar. Os diversos barulhos e cheiros que a nova Primavera traz se fazem presentes nas maritacas e caturritas ao amanhecer, nas florações dos jardins e das árvores em toda parte e também nos sorrisos que voltam a povoar as faces encobertas pelas coloridas máscaras. Mas, sempre tem um, ainda não vemos o final da pandemia.
O isolamento, a falta dos outros, familiares, amigos, amores, vão perdurar por meses. As torturas as quais essas condições nos prendem, longe estão de arrefecer. Os corpos já não suportam mais, as mentes não encontram subterfúgios para se manter a sanidade. Faltam psicólogos e psiquiatras para atender ao aumento de demanda para cada um e para todos.
Quem não já se encontra em estado desesperador, não compreende as numerosas e ruidosas manifestações de multidões nos finais de semana contrariando todas as medidas seguras de combater o aumento de contágio. O que se converte em crescimento dos infectados e dos sem esperança.
Procuro o resto de paciência e de otimismo, guardados a sete chaves no fundo do peito, para que os ruídos externos e as dores internas não me convertam também em um infeccionado de desamor. Que não seja um a mais nas linhas de dualidades impensadas. Não posso ser mais um a adoecer e condenar os que me cercam.
Então escolho os silêncios. As sombras coloridas das masmorras iluminadas dos meus pensamentos me ajudam a resistir. E sobrevivo por ausência de ruídos, por ideias transparentes, esboçando os projetos futuros de uma vida mais simples e melhor.
Se puder, serei mais um lutador pela melhoria de um mundo que precisa se manifestar. Pois, desculpando-me aos compositores da música, nem todos ʻsabem a dor e as delícias de ser o que éʼ.