Parece, mas não é
Regina Lydia Rodrigues Jaeger
Quando criança, adorava ver as imagens que se formavam nas nuvens e se transformavam conforme os ventos: um cachorro que virava um elefante, uma árvore que virava uma flor. Até hoje, quando olho para o céu, gosto de fazer este exercício de imaginação e percepção.
A arte também nos traz essa possibilidade, de perceber nas suas formas, muitas imagens. Principalmente na abstrata, onde quem define o que enxerga somos nós. E esta visão muda com o nosso estado de espírito. Uma mesma imagem, em momentos diversos, nos sugere novas leituras. Paul Klee costumava dizer que “A Arte torna visível, o invisível”, uma sucinta, mas profunda definição de arte. Ela pode se tornar visível e dizível, a partir de um insight ou a um colpo di fulmine, expressão italiana que significa amor à primeira vista ou a flechada do cupido – linda poética que transforma um “golpe de relâmpago”, em algo tão romântico.
Outro exercício interessante, é aquele que largamos um pouco de cada cor de tinta no centro de uma folha de papel. Em seguida a dobramos ao meio e passamos a mão para espalhar as tintas lá dentro. Ao abri-la, teremos uma imagem feita ao acaso, com os borrões e as mesclas das cores. Então olhamos para o resultado no intuito de enxergar alguma figura, o nosso cérebro completa a tarefa de juntar as partes e nos revela algo. Cada um verá com seu olhar único, mas diverso.
Também podemos virar a folha de ponta cabeça, de lado, inclinada. Como acontecia com as nuvens, a cada novo ângulo as imagens se transformam. Ao primeiro olhar, vemos um sorvete, que parece uma casquinha com duas ou três bolas, mas não é. Quando viramos a folha ao contrário, parece um palhaço com chapéu pontudo, mas não é. Se olhamos na horizontal, o chapéu parece a ponta de um lápis, será que é? E aquilo se torna um desafio, um jogo, até saciar a fome de imagem.
Foi isso que levou os astrônomos da antiguidade, de tanto observarem as estrelas espalhadas no céu, a imaginarem formas de pessoas, animais e objetos, ao agrupá-las e juntar os pontos. Assim nasceram as constelações, que foram batizadas conforme a imagem percebida: Ursa maior, Ursa menor, Cruzeiro do Sul, Centauro e outras mais.
E as manchas da lua? Atire a primeira pedra quem nunca tentou enxergar São Jorge e o seu Dragão…