Urbanidades
Rita Rheingantz
Daqui de baixo um cinza amarelado, um amarelo acinzentado, em formato circular fecha o quadrante. Fim da manhã, meio da tarde, não importa. Verão, outono ou primavera entristecida. O som do rush polui o silêncio. O calor venta, o vento arde. Círculos, cubículos e retângulos em arestas circulares de um dia inflamável. Edifícios colossais dispostos em círculos giram sem sair do lugar, como um vinil. Metrópole amplificada. Edificações tocam o céu. Janelas refletidas, natureza reprimida, horizonte artificial.
Fusão irônica de cores, tamanhos e formas.
A visão do alto, de fora é um exercício do anti olhar, uma inversão, como dois polos, negativo e positivo. É preciso transcender a ótica e a perspectiva, olhar de cima para baixo por trás do olhar de baixo, estando já em cima. A visão se amplia, parece que o leque circular se abriu, luzes e sombras dançam outra música, janelas retangulares e quadradas tem um prisma desigual. Árvores se tornam frondosas. Saturadas. Os ventos sopram com força em uníssono.
Por fora, a cidade pulsa antes e depois das doze badaladas. Buzinas, carros, bicicletas, metrôs, bondes. Vibrante e densamente povoada. Os ponteiros parecem sempre adiante, não há tempo de olhar no olho, as ruas são tomadas de passos. Passos que têm pressa de chegar.
Por dentro, vidas bem e mal vividas, alegrias, depressões, amizades verdadeiras e mentirosas, flores e frutas, amores livres, saudáveis e tóxicos, famílias, filhos, animais de estimação, solteiros, casais e parentes. Lares tranquilos e pós-guerras. Gente que nunca se verá, gente que nunca se verão, mesmo vivendo tão próximo, de frente ou de lado, em cima ou embaixo.
C’est la vie!