Removendo pedras

Quando tiver curiosidade sobre o que há no interior de um endereço, não hesite. Bata na porta.

Estava eu em Colônia de Sacramento aguardando o ferry boat para Buenos Aires e resolvi dar uma caminhada pelos arredores. Já havia esgotado minha dose diária de café e fuxicado em várias lojinhas de artesanato do local. Ainda restavam algumas horas de espera. Me dirigi para uma área não turística, o que mais adoro fazer em viagens.

Ao chegar em uma praça me deparei com um conjunto de casas geminadas e coloridas. Para quem olhava de fora gerava um certo estranhamento. A largura das moradias era, praticamente, a da porta de entrada. Avistei uma que tinha uma janelinha de vidro. Me aproximei e espiei. Um corredor comprido e ao fundo, uma peça de arte lindíssima, um jarro de porcelana enorme em cores azuis e branca. Daqueles que tem um prato embaixo. Não pensei duas vezes. Bati a sineta pendurada na parede e alguns minutos passaram.

No pequeno quadrado de vidro surgiu uma senhora vestida à rigor como empregada doméstica. Apresentei minha documentação e o bilhete do ferry, perguntando pelos proprietários. Estavam em viagem à Grécia. Eram médicos: ela argentina, ele uruguaio. Pedi a ela, a senhora que cuidava da casa, se eu poderia fazer um tour rápido para conhecer o interior da morada, explicando o que aguçara minha curiosidade. Fiquei à espera da negativa. O que, milagrosamente, não ocorreu! Ela, gentilmente, abriu a porta e me conduziu pelos cinco andares da casa mais incrível que eu conhecera até então. Cada andar era destinado a uma determinada ocupação: cozinha (de revista de decoração), quarto (de museu inglês), sala de música (estilo castelo francês, considerando as devidas diferenças de proporções de espaço), banheiros (com azulejos portugueses) e afrescos pintados em todos os tetos dos ambientes. No último andar, um terraço com jardim construído por pequenos bonsais, replicava, em tamanho minúsculo, uma área central de um dos jardins do Castelo Versalhes cuidados por Maria Antonieta. A visitação foi memorável! Tenho as imagens dos espaços visitados e capturadas por minha câmera fotográfica na caixa onde guardo Fotos Para Não Esquecer.

Olhando o portfólio de um amigo com imagens de Porto Alegre me deparei com esta aqui. Não reconhecendo o local perguntei a ele o motivo do click. A história do prédio me foi apresentada por ele, em uma narrativa intercalada pelos goles de cerveja, em um boteco do Centro Histórico da cidade.

– O Palácio do Ministério Público, mas muita gente conhece o lugar por Forte Apache, disse-me. Não acredito que não conheças!

– Pois é, não conheço mesmo. Nem sabia que tinha tantos palácios na cidade. Até já entrei naquele outro, o Palacete Santo Meneghetti, o Palacinho, do Vice-Governador do Estado do Rio Grande do Sul. O que virou Fundação da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, a OSPA.

– Pois devia, gostando de arte e museu como tu, pensei que já conhecias todos, me respondeu.

Estou aqui em frente ao Forte Apache. Cheguei cedo. Até toquei a campainha. Ninguém atendeu. Vou sentar aqui na calçada e esperar. Me disseram que talvez esteja proibido a entrada de visitantes. Lembrei de uma poetisa que escreveu – remove pedras e planta roseiras e faz doces. Só não sei fazer doces.

 

 


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