Ascensão barrada
Baiard Brocker
Jairo é o nome dele. 34 anos de idade. Mulher e dois filhos, um de 13, outro de cinco anos. Começou a trabalhar como caseiro, em um sítio, aos 23 anos. Nascido no norte do Estado, onde as oportunidades de trabalho não são as melhores. Ensino Fundamental incompleto. Essa é a situação de muitos meninos nascidos em famílias grandes, filhos de pequenos agricultores, vivendo da roça, sem possibilidade de continuidade aos estudos, até que chega a adolescência e os apelos do corpo e da alma começam a falar mais alto.
No sítio, local de trabalhar e de morar, a rotina de onze anos é varrer, podar, cuidar. Como os parentes ficaram no interior, inclusive os pais, as saídas são apenas para ir ao supermercado, no final do mês, para alguma consulta médica eventual, ou para levar equipamentos ao conserto. As férias são compradas pelo patrão, pois esse não confia em substitutos para zelar por seu patrimônio de que pouco usufrui. Contatos com vizinhos são raros, pois além de não haver muitos, o patrão não vê com bons olhos aproximações com pessoas estranhas em local de trabalho.
Mesmo com as restrições atuais de convivência e das alternativas que a vida impôs a Jairo, ele demonstra manter características comuns a pessoas nascidas no interior: o jeito de falar, uma certa ingenuidade. Isso nos faz acreditar tratar-se de pessoa simples, sem grandes aspirações, alguém para quem este sistema em que vivemos só reserva duas finalidades: servir e portar-se bem.
Fico a imaginar como seria estar na pele de Jairo e viver neste mundo em que, a cada dia, mais e mais se tem acesso a tecnologias e oportunidades de transformar o modo como vivemos e o espaço que ocupamos sem poder sair de onde está. Como seria estar preso a uma condição em que mudar implica, subitamente, perder emprego e casa sem a possibilidade de, em curto espaço de, recuperar essas prementes necessidades suas e de quem dele depende. Ao saber de sua condição, mesmo não sendo das piores, difícil evitar o desconforto de imaginar uma vida esvair-se sem que se vislumbre outra possibilidade de existência.
As oportunidades para ascender pessoal e profissionalmente estão aí para quem nelas quiser arricar-se? Não! Não vivemos mais no feudalismo quando ascensão social inexistia, e a dignidade humana era escassa . Mesmo assim, com os avanços dos tempos atuais, este mundo que oferece muitas “escadas” não permite a todos sequer acessá-las, percorrê-las, que dirá chegar ao topo, encoberto por névoa que impede pessoas como Jairo de visualizar seus degraus conformando-os a ficar ao rés do chão contemplando, à distância, o olimpo criado com o trabalho deles e onde o ingresso lhes é cobrado e, ao mesmo tempo, negado.