Sítio da Lagoa, incerto dia de outubro de 2024.
Mana querida:
Ontem vi teu rosto através da vidraça. Contemplava o verde regenerado de primavera, e me lembrei do teu encantamento pelas plantas. Lembrei-me da tua sensibilidade para reproduzir as cores com precisão. Tu também deves te recordar daquela vez em que salpiquei com água sanitária meu blusão, no primeiro dia de uso, e te prontificaste, ante minha incredulidade, a restaurá-lo. Ficou perfeito. Ainda hoje, ao vesti-lo, lembro-me do teu rigor para conseguir a tonalidade exata.
A visão na janela me trouxe ainda outras memórias! Tantas… Desordenadas. Dos tempos da tua infância e da minha adolescência. Da distância que não consegui transpor para te alcançar e partilhar aspirações. Do tempo recente. Das duas semanas, quando, antes de partir, ouviste com insistência a canção da Mariza Monte. Aquela que fala na espera do tempo (que não esperou); em portas e janelas sempre abertas para a sorte; nas tuas amadas flores, a enfeitar caminhos, vestidos, destinos. Fala no lugar ideal, que perseguiste a vida inteira, e do qual talvez tenhas encontrado um arremedo, quando moraste na casa da praia.
Amada irmã, a saudade pune meu coração, mas não o impede de sonhar com um reencontro feliz, no Vilarejo preparado para nós desde o início dos tempos por aquele que nos idealizou.
Até mais ver.
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