Tetê Lopes em foto de Leandro Faccini

Paraíso

Tetê Lopes

No final dos anos 1970, fui morar na Bahia. O primeiro ano em Salvador, depois em Camaçari, onde se iniciava o Polo Petroquímico. Cidadezinha pequena, muito mato em volta, ruas de chão batido, lugarzinho pobre. Na verdade, no bairro de Águas Claras, mais retirado, havia casas de veraneio, pois a cidade era banhada por um rio de água limpa, e algumas famílias de Salvador construíram ali moradias para refugiar-se do barulho e poluição da metrópole.

Alugamos uma dessas casas, bonita, com um rico avarandado em volta, onde as redes languidamente convidavam à indolência. No pátio grande, muitos coqueiros carregados de frutos, um pé de jambo, uma jaqueira, arvoredo estranho mas convidativo para gentes do Sul. Bem na frente da casa, no jardim, um pinheiro pequeno se erguia, oferecendo-se para ser iluminado no Natal que se aproximava.

Paisagem bonita, que induzia ao repouso. Mas cadê sossego, com três crianças saudáveis exigindo brincadeiras, comida, banho, atenção constante? O dia a dia não era tão paradisíaco quanto o lugar levava a imaginar. Aos poucos, porém, as coisas se ajeitavam. Uma pessoa para auxiliar nos trabalhos da casa e uma escolinha próxima, para acolher os meninos em parte da tarde, permitiam algum descanso. O filho mais velho já estava em idade de alfabetização, e foi um choque quando conheci a professora, que não apresentava sequer um dente superior no sorriso. Se foi por esforço individual dele, não sei, mas a verdade é que foi o filho melhor alfabetizado dentre os três.

A vizinhança praticamente não existia, o isolamento era grande. Exceto pela casa ao lado, habitada por um casal. A mulher ficava nas lides domésticas, o homem saía de manhã e voltava à tardinha. Ela não se relacionava com ninguém, porque o marido era advogado em Camaçari. O fato de ele ser advogado em Camaçari, no meio do nada, a fazia acreditar-se superior.

Essa circunstância, aliada ao desapontamento que tivemos ao ver, certa manhã, que o pinheiro da frente tinha sido cortado e furtado, nos fez aprender, com alguma tristeza, que uma bela paisagem, uma casa agradável, uma natureza fascinante – nada disso é sinônimo de tranquilidade e prazer, quando o ser humano está presente.

Aprendemos que o paraíso é algo que está dentro de nós.

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