Guy Billout por Ronaldo Lucena

Ando não querendo saltar

Ronaldo Lucena

Política é campo minado, de ferver os nervos e saltar as veias no pescoço. Literalmente as pessoas tomam partido e não há como fugir dessa luta quando se acende a luz. A batalha do campo das ideias é desconhecida por muitos. Tapa na cara e canela é do pescoço pra baixo. Adjetivação percorre o nível sub-subsolo, na camada lamacenta do pior que se tem. Legítimo umbral das foices decapitantes. Mão ágil que clica no excluir amizade. Sem hesitação. Como se a vida fosse apenas uma rede social.

Difícil de se ver elegância no gramado, escuta atenta e entendimento. Resiliência e empatia, nem pensar. Que falta faz os desacreditados coachs e a inteligência emocional ensinando baixar o volume, pisar no freio e deslizar na passarela. Isso deve ser privilégio de poucos, de almas iluminadas com sangue frio e alcalino. Um dia se chega nesse estado hipnótico?

A regra é que a regra de ontem não vale hoje. O meu erro de véspera não perdoa, ou se compadece, da mesma falha do oponente. Nunca é penalidade a ser cobrada, se for contra meu time. Quero VAR, quero o Papa, quero xingar de todos os vocábulos que terminam em a-o-til grandão ou ista. Adora-se os istas. Acusar, claro. Difícil se enxergar no espelho, olhar sempre turvado.

Embrenhar-se na luta política é como saltar de uma plataforma com trampolim duplo. Você pode treinar um parafuso, um virado, um pontapé à lua. Talvez um salto de frente, costas, equilíbrio. No lançamento ao espaço, resta a queda vertiginosa. A plateia se divide entre os que torcem pelo sucesso, pelo contorcionismo preciso dos argumentos musculares, pela entrada lisa na água, esparramando o mínimo. Entender quanto vale cada salto é problema alheio. E há os que torcem pela barrigada, pelo destrambelho no salto, pelo esparramo de umidade molhando a todos, inclusive as tabelas de notas. Se bater com a cabeça no trampolim, rasgar a pele e manchar de sangue a piscina, mais aplausos estrategicamente reprimidos.

Nessas duas possibilidades de salto, no trampolim da direita, ou da esquerda, o cerimonial é o mesmo. Pode se contorcer, se exibir, rodopiar, inflar a jugular, a queda na água é inevitável. Independente da nota dos jurados, todos saem molhados, vencidos e vencedores. Como fugir disso, aos que sobem todos os degraus da plataforma e caminham até a borda encruzilhada? Para quem já saltou no trampolim da direita, e também no trampolim da esquerda, há dois caminhos. Acena para o público, faz reverência, atira beijos, faz cara de miss arrependida, de noivo fugindo da igreja, de burro quando foge, desce todos os degraus e vai para casa assistir um filme de comédia americana. Ou se joga no centro do trampolim, apelidado de muro. Mas a queda é da mesma altura. Só se certifique da profundidade das águas.

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