Gregory Harlin por Regina Lydia

Fatídica coincidência

Regina Lydia Rodrigues Jaeger

Incrível, mas aconteceu hoje comigo. Tinha acabado de ler a crônica do Paulo Mendes Campos, “A Lagartixa” e, como já anoitecia, resolvi fechar a casa. Subo as escadas e fecho as primeiras janelas, que são do tipo de correr. Tudo tranquilo. Chego no meu quarto, corro a folha de vidro pra alcançar a veneziana e fechá-la. Foi quando aconteceu… A pobre lagartixa, bonita, gordinha e saudável, cai morta nos trilhos, de barriga pra cima, parecendo um brinquedo de borracha.

Corro aos gritos, a casa vazia, só os cachorros me olham como a perguntar o que aconteceu. Eu, que não gosto de matar nem uma mosca, encho-me de culpa por ter ceifado, assim, num golpe, a vida da bichinha. Justo após ter lido aquela descrição do PMC, de como ele assassinou duas lagartixas! E nem gostei de ler aquilo, mas, em se tratando de um dos mestres da crônica, digeri, literariamente falando. Não entrei mais no quarto. Esperaria meu marido chegar para fazer o trabalho sujo – a retirada do cadáver.

Meu consolo foi que já salvei muitas, com uma técnica que eu mesma desenvolvi. Quando encontro alguma, antes que alguém vá a sua caça, eu a resgato. Pego uma caixa de pasta de dente ou remédio, de preferência as de boca mais larga, e persigo a dita cuja para encurralá-la. Com delicadeza, faço-a entrar na caixa e fecho bem rápido. Vou até o jardim junto às plantas e abro a caixa. Adoro vê-las sair rebolando rumo a liberdade. E pensar que, quando adolescente, tinha tanto medo delas. Meu pesadelo era acordar com uma caindo, gosmenta, sobre o meu rosto.

Houve uma época, em que as lagartixas sumiram aqui de casa. Podia-se fechar as janelas sem receio de matar alguma de tocaia nos trilhos. Foi quando a Lulu era a dona do pedaço: uma gata vira-lata, nem tigrada, nem preta. Era toda branca, feito uma fantasminha camarada. Conquistou até a Saori, nossa cachorra akita, raça nada afeita a gatos, nem a outros animais. Ficaram tipo mãe e filha.

Com as lagartixas, a relação não foi tão amigável: Lulu era uma perfeita serial killer. Seu instinto de caçadora era atávico, nem todos os mimos o abrandaram. Não demorou para as bichinhas se darem conta de que, lá em casa, não era um lugar seguro para elas. Vez ou outra, aparecia uma desavisada – sim, porque, acredito que a notícia se espalhou entre elas, por um tipo de código Morse animal.

Oh, que saudades da Lulu! Faz tempo que ela se foi. Desde então, as lagartixas sentiram e deram o aviso – território livre, vamos invadir! E cá estão elas de novo…

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